sábado, 1 de agosto de 2009

Sustenta habilidades: habilidades para habitar o Planeta em busca da sustentabilidade

Sustentabilidade é uma dessas palavras com sentidos que se movem, variam nos contextos, nas práticas, nos discursos. Sabemos, no entanto, que só aquilo que faz sentido nos é caro. Mas, “fazer sentido” também é um arcabouço de possibilidades de racionalidades, sentimentos e sensações. Os sentidos que damos as coisas são conferidos por um complexo sistema de interações abstratas e subjetivas, mas também concretas e objetivas. É assim que operamos com os sentidos no dia a dia. Daí a importância das coisas terem sentido. Sem sentido, ou com pouco sentido, entramos no campo de uma nuvem cinza, amorfa e etérea. Ou ficamos com medo e nos afastamos; ou, simplesmente, ignoramos a coisa sem sentido. Mas, como construímos o sentidos das coisas, para que, então, possamos habitá-las?

A ideia desse blog é aproximar esse conceito de nossas vidas, torna-lo palpável e praticável nas várias instâncias de nossa existência individual mas, principalmente, coletiva. Se há um consenso em torno das sustestabilidades (reparem no plural!) é que elas funcionam apenas em relações. Não tenho como ser “sustentável” por mim mesmo, isolado do resto da nossa casa, do nosso prédio, da nossa cidade, do nosso Planeta. A primeira habilidade para praticar as sustentabilidades seja talvez reconhecer as inúmeras relações de diversidade do mundo. Essa habilidade torna-se cada vez mais difícil, já que nossa cultura global ocidentalizada e capitalista privilegia a exaltação do Eu como modos operandi. Cada um de nós é estimulado a vencer sobre o outro, na demonstração e exaltação de bens de consumo “únicos”.

Mas, de fato, os sentidos compreensíveis da existência que vigoram para uns não vigoram para outros. Daí que, conceber a sustentabilidade como práticas de vivências, modos de fazer, tornando-a também um certo tipo de habitus, requer sempre uma contextualização. Falar em sustentabilidade no Brasil, um país continente, implica em reconhecer nossa diversidade cultural, mas também nossa avassaladora desigualdade estrutural. Quem está na miséria, do lado invisível do capitalismo, não tem essa palavra em seu discurso e em suas práticas. A ordem do dia é ter o que comer, se virar para ganhar algum, estar ligado para não morrer. A lei da sobrevivência fala mais alto. E como poderia ser diferente? Por isso, nosso cuidado deve ser em evitar qualquer tipo de julgamento moral. Não é que não exista o certo e o errado. A questão é que o “obviamente” certo para alguns não será inteligível para outros, e isso acontece com o “obviamente” errado também.

Produzir sentidos para as sustentabildiades é, antes tudo, apostar em uma sinceridade semântica. Vivemos imersos em um mundo em grave crise sociambiental, mas não aprendemos a viver nele de modo diferente. Nossos valores e individualidades não contribuem para isso. O mundo continua sendo um só e nós estamos cada vez mais sós. Isolados em carências afetivas e reflexivas, vamos nos tornando mornos, vamos nos apegando aos “tanto faz”, “isso não me interessa”. Se temos um relativo conforto material que nos garante a existência, as coisas tendem a ficar do jeito que estão. Aquilo que não sentimos como experiência real é protelado. Aquecimento Global? Onde? Não dentro de um carro com ar condicionado! Não nos finais de semana e feriados durante um churrasco ou aniversário? Pouco provável. Esquecemos que somos co-responsáveis ou sabemos que somos e ligamos o botão “fazer o quê, não é mesmo?”. Consumimos e descartamos como se o Planeta fosse infinito. Essa super potência egóica nos indica o quanto ainda somos imaturos e medíocres enquanto adultos, criando uma permanência heróica em nossas narrativas internas. O Eu superlativo é uma cascata devastadora para o Planeta, visto que superdimensiona o “instinto de sobrevivência” em uma espécie de uma imensa complexidade social e cultural.

A ciência e a tecnologia na prestação de serviços ambientais têm tido um papel fundamental, porém, não bastam por si só. Não há tecnologia que de conta de sanar um dívida que se iniciou a quatro séculos atrás. Tecnologia, até onde se sabe e no que a ciência aposta, não é uma Divindade capaz de criar um botão auto limpante para nossos rastros pegajosos. Tecnologia é uma ferramenta, tanto para o “bem”, como o “mal”. Bem estar de uns, maus estares de muitos, até agora. Não podemos esquecer que a tecnologia, até ontem, serviu muito bem como força propulsora a um capitalismo nada verde. Alias, existe algum tipo de capitalismo que possa ser “verde” ou “sustentável”? É de se pensar se uma coisa não é completamente antagônica a outra. Na essência de sua filosofia, o capitalismo continua sendo igual ao que sempre foi – satisfação (lucro da mais valia) de uma minoria que detém os bens de produção, em prol do sacrifício da exploração do resto do mundo, dos humanos e da natureza. Uma diferença de hoje nessa equação é que os bens de produção também são etéreos, são simbólicos, são bits de informação financeiras que movimentam economias especulativas. Para que e para quem?

Para abarcar o tema da sustentabilidade, temos também de percorrer os porões de nossos desejos e vontades, de nossos sonhos de olhos abertos. O desejo, tido como força propulsora de nossas ações nos faz querer ser e agir de tal ou qual modo. E nós, via de regra, desejamos a felicidade, o que é um conceito e uma prática muito particular. Mas nossas imagens de felicidade, até então, não foram e não são formadas pensando em habitar o Planeta de modo responsável e coerente. Isso pouco passa por nossas cabeças e, na prática do dia a dia, se reduz a algumas atitudes pontuais e singelas, que são importantes, mas efêmeras e insuficientes considerando a gravidade dos problemas sociambientais que enfrentamos hoje. Em vista disso, deveríamos desativar nossos mecanismos de proteção através dos quais nos protegemos e nos auto justificamos (o heroísmo egóico ficcional) e assumirmos sinceramente nossas incompetências e incapacidades enquanto seres humanos para habitar esse Planeta. Assumir isso é sofrível, machuca o nosso Ego como se atingisse nossa alma ou essência (natureza humana histórica) e coloca uma questão clara e amarga: queremos ser diferentes?

É comum que a sustentabilidade seja proferia como uma integração entre economia (capitalista), sociedade e meio ambiente. Nas interfaces entre esses subsistemas surge medidas de empreender um mundo melhor, feito por pessoas melhores. Isso quando a sustentabilidade é tomada como estratégia sine qua non e equalizada em processos participativos e emancipatórios entre governo, empresas e pessoas da sociedade civil. Mas há também a disseminação de uma sustentabilidade de fachada, markenting verde e perigoso para que algumas corporações possam continuar atuando em sua devastação das pessoas e da natureza. Nesse contexto global, países como a China, que abriram suas portas para o pior do capitalismo e da globalização, vivem em um economicismo destrutivo mais intenso que o assistido quando do início da revolução industrial, e isso em pleno século XXI. Esse é um dos paradoxos que a significação da sustentabilidade vem trazer para o debate. E nós, consumidores egóicos, achamos o máximo comprar produtos produzidos na China, com seus preços reduzidos. Economia de mercado como indicador? Deplorável índice.

O famoso verso de Drummond, que diz “Mundo mundo vasto mundo/Se eu me chamasse Raimundo/Seria uma rima, não seria uma solução” talvez expresse o cerne da nossa questão – livrarmo-nos de nossos subterfúgios para encararmos a difícil realidade da qual somos co-reponsáveis em produzir, sendo a nossa responsabilidade proporcional a nossa consciência, com certeza. Quanto mais soubermos e sentirmos a necessidade da mudança e continuarmos a viver como sempre vivemos, estaremos praticando uma hipocrisia indesculpável, pagável com o futuro da existência humana na Terra.


Mas, o que de fato podemos fazer para praticar a sustentabilidade em nosso cotidiano? Primeiro temos que querer o que pressupõe o entender a importância de. As mudanças climáticas e o aquecimento global é um argumento científico. O mal estar da civilização, com o desencadeamento cada vez mais intenso de depressões é outro. A violência cada dia mais explícita, a crise econômica mundial, a extinção de espécies, a devastação da floresta amazônica, a eminente escassez de recursos hídricos, a falta de sentido na vida, ou o sentido apenas em ter produtos, as guerras e o terrorismo, são outros. Mas e daí, se isso é lá e não aqui? E aqui? E agora, José (Maria)? O que quero dizer é que as sustentabilidades só se sustentam se encontramos nessa maré de desgraças soluções práticas e condizentes com nossa realidade, desde que isso também tenha um impacto positivo para o coletivo e para a Vida como um todo.


Que esse blog possa, ao nos fazer pensar e refletir, nos dar a energia para ação de transformar, de querer sustentar relações e hábitos diversivicados para as sustentabilidades. Sejam muito bem vindas/os!


Para começar, um breve vídeo da Carta da Terra em Ação!

A Carta da Terra Brasil from Carta da Terra Brasil on Vimeo.

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